“Pavilhão Literário Cultural Singrando Horizontes”–Recebo e repasso:

*Blog já programado até 2015…

 

Pavilhão Literário Cultural Singrando Horizontes

Uma Trova de FLÁVIO ROBERTO STEFANI

Porto Alegre/RS
Na pescaria, de fato,
notei teu jeito chinfrim,
mas o olhar era de gato:
um no peixe e outro em mim...
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Um Poema de CELSO BRASIL
(Curitiba/PR)
Tu, eu e a poesia

Te amo com toda energia,
Te quero bem perto de mim,
Mas também tem a Poesia!
Eu Quero as duas, enfim!!!
Te peço... não tenhas ciúme!
Sem ela não posso te amar!
Da minha montanha, ela é o cume,
Do cume, amor te quero gritar!
Abro os braços à magia,
Entre eles, sempre estarás.
Mas se não abraço a Poesia,
A ti... como me declarar?
Poesia, minha eterna amante.
Tu, minha eterna paixão.
A Poesia me leva adiante!
E tu! levo em meu coração.
Se me deixares amá-la,
Para ti também existirei.
Mas se me apartares dela,
Sem versos, então, morrerei.
Ficarás chorando no báratro,
Quando eu tiver que me ir.
Consolar-te até o reencontro,
Sei que a Poesia há de ir.
Tu e a poesia, então, juntas
Viverão a me relembrar.
De vez em quando unidas,
Ambas se porão a chorar.
Nesse momento, querida,
Certamente, ali estarei.
Tu e a Poesia formam minha vida!
E, assim, nunca mais morrerei.
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Um Haicai, de EDGLEY SILVA GONÇALVES
São Paulo/SP
Roxas, amarelas
flutuam as folhas secas
ao sabor do vento.
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Galáxia de Aldrávias de ANNA RIBEIRO
Itajaí/SC
nas
entrelinhas
a
busca
de
mim
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O Universo Poético de EMILIANO PERNETA
(Emiliano David Perneta)
Curitiba (1866 – 1921)
Orgulho
(Ao João Itiberê)

Nasci para viver no meio do que é belo.
A miséria me causa um horror sem igual.
Eu não posso tocar de leve com o escalpelo
Numa ferida, sem que isso me faça mal.
Nasci para viver no meio d’um castelo,
Onde eu domine, mas com um gesto senhorial.
Não quero conhecer o mal, não quero vê-lo;
O mando d’um artista é um manto imperial.
Antes morda-me o Ódio assim do que a Piedade;
Antes quero rugir, do que chorar de dor;
E prefiro ao pesar, que o coração me invade,
E abate-me a tremer, tal qual uma criança,
O furor de brandir nas mãos, como uma lança,
Este Orgulho, que enfim é uma giesta em flor!
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O Universo Poético de REGINA MÉRCIA
(Regina Mércia Sene Soares)
Novo Horizonte/SP
Essa Felicidade?

Existe essa tal felicidade?
Essa pergunta faço com tristeza
Era só meu aquele amor
Não era a dois...
De repente a dor me surpreende
Por que um amor não correspondido?
Duvidas surgiram de que eu era...
Iludida, só o meu amor vivia
Sinto muita falta e sinto-me
Entregue aos medos e receios
Feliz fiquei ao perceber
Que estava amando...
Meu coração levava consigo
O aconchego de alguém...
Que havia chegado
Precipitando talvez o encontro
Com esse alguém que quisesse
Realmente me amar...
Só esperando o momento certo
Bem lá escondido no cantinho
Do coração cheio de desejo
Para nascer um grande amor…
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Uma Trova Lírica Filosófica, de JOSÉ ALMIR DA LUZ JUNIOR
Paraná
Português bem pronunciado
é o que vem do coração.
Deixe o pronome de lado -
vem cantar, minha canção.
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O Universo do Haicai de CARLOS SEABRA
São Paulo/SP
velho jornal
levado pelo vento
prevê temporal
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O Universo Poético de RENATO SUTTANA
Barroso/MG
Até o fim

Que não.
Que não importa.
Que do modo como está é o bastante –
que ser o bastante não importa:
que durar entre os momentos,
que persistir, que restar
não tem a menor importância.
Que só tem importância compreender
que, sendo este o modo
e sendo este o lugar,
tudo o mais é somenos,
porque tudo o mais é tal qual
e é o que menos importa,
porque à noite se dissipa no sono.
Que não.
Que nunca mais.
Que deste modo ou em qualquer lugar
é sem importância e sem brilho,
e assim será até o fim (com seus abismos,
suas janelas, seus passadiços, seu laços)
e jamais será o bastante,
qualquer que seja o caso ou o desejo,
até o fim.
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Galáxia Poética da SUELY BRAGA
(Suely Eva dos Navegantes Braga)
Osório/RS
Lampejo de luz

Há uma luz no infinito.
As estrelas da memória embalam as ausências.
O vento leva as lembranças.
Uma nuvem cobre as recordações.
O peito soluça nas brasas da saudade.
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Uma Trova do IZO GOLDMAN
Porto Alegre/RS 1932 – 2013 São Paulo/SP
Quem morreu naquela Cruz,
foi o Corpo e nada mais:
ninguém apaga uma Luz
crucificando ideais!
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Um Soneto de MARILENE BORBA
Osório/RS
Vida, saudade e poesia

             No útero prenhe da noite...
Vida, Saudade e Poesia.
Brisa se faz lua,
nuvens vestidas de algodão
dançam com o cheiro de vida.
Versos se enamoram,
se abraçam em lembranças,
oram às estrelas aos ouvidos do vento.
Apadrinhada pelo céu
a noite se veste de pura seda.
Nasce o poema!
A noite descansa ao som de Chopin.
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Constelação Haicaista de JOSÉ MARINS
Curitiba/PR
chega a noite longa
esquecido amarelou
o feixe de couve
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Velhas Lengalengas e Rimas do Arco-da-Velha Portuguesas
ERA UMA VEZ…
Estas lengalengas eram usadas como efeito cómico, quando as crianças pediam a alguém que lhes contasse uma história e o narrador não tinham nem tempo nem paciência para as contar, calando-as com estas rimas curtas.
Era uma vez
Um gato maltês
Tocava piano
Falava francês
Saltou-te às barbas
Não sei que te fez
A dona da casa
Chamava-se Inês
O número da porta era o 33!
Queres que te conte outra vez?
.
(http://luso-livros.net/)
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Uma Trova da Rainha dos Trovadores
LILINHA FERNANDES

(Maria das Dores Fernandes Ribeiro da Silva)
Rio de Janeiro 1891 – 1981

De idéias velhas ou novas,
eu faço trovas também.
Quem gosta de fazer trovas,
nunca faz mal a ninguém.
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O Universo Poético de EMÍLIO DE MENESES

(Emílio Nunes Correia de Meneses)
Curitiba/PR (1816– 1918)
Um gaúcho esquentado

Lá na terra dos Pampas tem o nome
De Chimarrita, diz o Leal de Souza,
E este apelido afirmam que o consome
E é o que o há de levar à fria lousa.
Se lho repetem briga e já não come,
Não pára, não descansa, não repousa,
Agüenta a sede, suportando a fome,
Dando o estrilo feroz por qualquer cousa.
Entretanto, não tem os dotes falhos;
Do talento gaúcho é um belo adorno
E tem brilhantes feitos e trabalhos.
Rapadurescamente espalha em torno,
Uma impressão de cheiro a vinha-d'alhos,
De um leitãozinho mal tostado ao forno.
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Constelação Poetrix de GOULART GOMES
Salvador/BA (1965)
Bruxa

escrever: palavras coser, cozer
poesia, linha e pão misturo
mergulho em seu caldeirão
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Uma Trova Humorística, de DIVENEI BOSELLI
São Paulo/SP

A garota muito prática
joga fora, sem dilema,
seu livro de matemática,
que, afinal...só tem problema!
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O Universo Poético de ANTONIO MANOEL ABREU SARDENBERG
São Fidélis/RJ (1947)
Cidade de Santos

Oh! Santos de tantas santas,
Santos de belas meninas,
Santos de lindos olhares,
De barcos singrando os mares
E alegres bares nas esquinas.
Oh! Santos de lindos jardins
Adornando as enseadas,
Seu perfume é de jasmim,
Sua beleza é sem fim,
Deixa a vida apaixonada!
Santos da balsa que traz
Alguém que se espera tanto
Santos de luz e de paz
Santos de tantos encantos!
Santos de grandes poetas
Que bordam versos brilhantes,
Santos de grandes atletas,
Santos de Reis e profetas,
Santos de ternas amantes.
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Uma Trova Hispânica, do Chile
JAIME CORREA
Has perdido tu ternura,
la sonrisa misteriosa.
Tu belleza es mi locura,
señorita tan hermosa.
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Constelação de Sonetos da DOROTHY JANSSON MORETTI
(Sorocaba/SP)
Sobre as nuvens

Na lida ingrata e rude do vaquejo,
no carrascal inóspito e ardente,
manda uma prece o pobre sertanejo
a um Deus que há muito lhe parece ausente.
Nos seus olhos vermelhos, o desejo
de que uma chuva, mesmo impersistente,
venha molhar, com dúlcido bafejo,
seu chão gretado de um sol inclemente.
Ao dedilhar simplório do violeiro,
chora a toada monótona o vaqueiro,
na noite sem espera e sem promessa.
E quando sobre as nuvens paira a prece,
quando a esperança já quase fenece…
um raio, o espaço, rútilo, atravessa.
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O Universo Poético de CECÍLIA MEIRELES
(Cecília Benevides de Carvalho Meireles)
Rio de Janeiro/RJ (1901 – 1964) Rio de Janeiro/RJ
Canção do deserto

Pelo horizonte de areias,
reclina-se a voz do canto.
A moça diz, muito longe:
"Eu sou a rosa do campo ..."
O beduíno pára e escuta,
vestido de pensamento, sozinho,
entre as margens de ouro
do ar e do deserto imenso.
"Eu sou a rosa do campo..."
E olhando para as ovelhas
sente o chão verde e macio
e flores pelas areias.
"Eu sou a rosa do campo..."
Mas tudo o que ouve e está vendo
é poeira, apenas, que voa:
o vento dá voz ao vento ...
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O Universo Poético de GUILHERME DE ALMEIDA
(Guilherme de Andrade e Almeida)
Campinas/SP, 1890-1969
Nós, XXVII

Hoje voltas-me o rosto, se a teu lado
passo; e eu baixo os meus olhos se te avisto.
E assim fazemos, como se com isto
pudéssemos varrer nosso passado.
Passo, esquecido de teu olhar — coitado!
Vais — coitada! — esquecida de que existo:
como se nunca tu me houvesses visto,
como se eu sempre não te houvesse amado!
Se às vezes, sem querer, nos entrevemos;
se, quando passo, o teu olhar me alcança,
se os meus olhos te alcançam, quando vais,
— ah! só Deus sabe e só nós dois sabemos! —
volta-nos sempre a pálida lembrança
daqueles tempos que não voltam mais!
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Universo Poético de IALMAR PIO SCHNEIDER
Porto Alegre/RS
Soneto a Gonçalves Dias
(Falecimento do poeta em 3.11.1864- In Memoriam)

Poeta das palmeiras e também
dos indígenas, com força genial,
cantou grandes amores que ninguém
houvera feito assim sentimental…
Lendo seus versos a saudade vem
me visitar de modo especial,
da minha terra que palmeiras tem
onde o sabiá modula sem igual.
Gonçalves Dias, vate da natura,
és um astro que em nosso céu fulgura,
com tuas mais românticas poesias…
Soubeste transmitir a inspiração
que as Musas te trouxeram na soidão
do mundo ideal das alegorias !
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Galáxia Triversa de ALVARO POSSELT
Curitiba/PR

Como o poeta sofre
Faz o caminho in-verso
para chegar na estrofe
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Uma Trova do Rei dos Trovadores
ADELMAR TAVARES
Recife/PE 1888 – 1963 Rio de Janeiro/RJ

Os "anjos da guarda" gostam
da rede dos pobrezinhos,
que dormem a sono solto,
ao Deus dará, nos caminhos
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O Universo Poético de MARIO QUINTANA
Alegrete/RS (1906 – 1994)
A Rua dos Cata-Ventos

I
Escrevo diante da janela aberta.
Minha caneta é cor das venezianas:
Verde!... E que leves, lindas filigranas
Desenha o sol na página deserta!
Não sei que paisagista doidivanas
Mistura os tons... acerta... desacerta...
Sempre em busca de nova descoberta,
Vai colorindo as horas quotidianas...
Jogos da luz dançando na folhagem!
Do que eu ia escrever até me esqueço...
Pra que pensar? Também sou da paisagem...
Vago, solúvel no ar, fico sonhando...
E me transmuto... iriso-me... estremeço...
Nos leves dedos que me vão pintando!
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O Universo de Versos de BERNARDO TRANCOSO
(Bernardo Sá Barreto Pimentel Trancoso)
Vitória/ES, 1976
Uma poesia sobre nós

Nada vai separar, existem laços;
Nem vai desenlaçar, nem nos espaços
Entre os passos que juntos damos, sós;
Nem antes dos abraços, nem após.
Nada vai desatar tantos amassos;
Nem vai desamassar, nem nos escassos
Truques, traços, herdados dos avós,
Nossos braços, cruzados como nós.
Todo o meu corpo, todo o teu, também,
São bobinas trançadas de um motor,
Bouganvilles depois do sol se pôr,
A liberar calor como ninguém.
São nossos corações, que vão e vêm,
Pontas de um grande laço, que é o amor.
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Universo Trovadoresco de CORNÉLIO PIRES
Tietê/SP (1884 – 1958) São Paulo/SP

Tutor da terra foi Rei
E é sempre Rei, o Amado Jesus,
Teve a coroa de espinhos,
Por trono, o lenho da cruz
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O Universo Sonetista de ALMA WELT
Novo Hamburgo/RS (1972 – 2007)
O pó e a luz

O pó tem sua essência revelada
Quando dança na luz filtrada em frestas.
Para o grego era a alma figurada
Que nos cobre o mundo e as arestas.
É um consolo saber que tudo vive,
O mistério preenche-lhe o vazio,
E o nada, pavor que sempre tive,
Seria a razão mesma do que crio...
Pois saber quão pouco conhecemos
Nos dá esperança de sentido
Nesta vida às cegas que vivemos.
Assim, é bem possível vida eterna
E até um paraíso prometido
Na pequenina luz de uma lanterna...
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Uma Poema de GISLAINE CANALES
Porto Alegre/RS
Amo

Amo com toda a força do meu ser.
Amo a beleza, a arte, uma canção.
Amo o eterno desejo de vencer.
Amo os versos que vêm do coração.
Amo as flores, é grande meu querer.
Amo essa amarga e triste solidão.
Amo os sonhos que estou sempre a tecer.
Amo o infinito em sua imensidão.
Amo também a morte, dura e fria.
Amo na morte, toda a ausência e dor.
Amo meu mundo em meio à fantasia.
Amo a tristeza, e mais, amo a alegria.
Amo a vida e esse mundo encantador.
Amo o amor, amo a paz, amo a poesia.
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O Universo de FERNANDO PESSOA
(Fernando António Nogueira Pessoa)
Lisboa/Portugal   1888 – 1935

Tens uma rosa na mão.
Não sei se é para me dar.
As rosas que tens na cara,
Essas sabes tu guardar.
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Uma Trova do Poeta do Amanhecer
ADEMAR MACEDO
Santana do Matos/RN 1951 - 2013 Natal/RN

Num sonho eu me fiz refém,
ao viver uma emoção
que o próprio sonho a retém
na mente e no coração…
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O Universo Sonetista de AFONSO FELIX DE SOUSA
Jaraguá/GO (1925– 2002) Rio de Janeiro
-
Sonetos Elementares
XVIII

Dentro de mim a música e os menores
gestos da amada. O âmago da noite
esconde prantos, poderosos risos
inundam as paredes do invisível.
Sou eu – do mundo em roda enfim liberto,
as mãos sem tato, o espaço sem limites.
Anterior a mim, livre das sombras
das mulheres que amei, livre de mim.
E sinto que sou eu. Vejo no espelho
do meu passado os sonhos decepados,
coração e sentidos entre cárceres.
Livres no espaço sem manhãs e noites,
nossas almas se fundem no silêncio
onde os germes do amor fecundam músicas.
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O Universo Poético de AUTA DE SOUZA
Macaíba/RN (1876 – 1901) Natal/RN
Lídia
(a Esther)

Feliz de quem se vai na tua idade,
Murmura aquele que não crê na vida,
E não pensa sequer na mãe querida
Que te contempla cheia de saudade.
Pobre inocente! Se alegrar quem há de
Com tua sorte, rosa empalidecida!
Branca açucena inda em botão, caída,
O que irás tu fazer na eternidade?
Foges da terra em busca de venturas?
Mas, meu amor, se conseguires tê-las,
De certo, não será nas sepulturas.
Fica entre nós, irmã das andorinhas:
Deus fez do Céu a pátria das estrelas,
Do olhar das mães o Céu das criancinhas.
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Uma Trova do Príncipe dos Trovadores
LUIZ OTÁVIO
(Gilson de Castro)
Rio de Janeiro/RJ 1916 -1977 Santos/SP

A trova é tão pura e humilde
que eu julgo, pensando nisto,
que o primeiro trovador
foi, por certo, Jesus Cristo.
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O Universo Poético de VINICIUS DE MORAES
(Marcus Vinicius da Cruz de Melo Moraes)
Rio de Janeiro (1913 – 1980)
Soneto de véspera

Quando chegares e eu te vir chorando
De tanto te esperar, que te direi?
E da angústia de amar-te, te esperando
Reencontrada, como te amarei?
Que beijo teu de lágrima terei
Para esquecer o que vivi lembrando
E que farei da antiga mágoa quando
Não puder te dizer porque chorei?
Como ocultar a sombra em mim suspensa
Pelo martírio da memória imensa
Que a distância criou — fria de vida
Imagem tua que eu compus serena
Atenta ao meu apelo e à minha pena
E que quisera nunca mais perdida...
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O Universo de J.G. DE ARAÚJO JORGE
(Jorge Guilherme de Araújo Jorge)
Tarauacá/AC 1914 – 1987 Rio de Janeiro/RJ
" Linha Circular... "

Eu era um homem simples, verdadeiro,
na rotina da vida cotidiana,
às vezes desejando coisas loucas
mas vivendo o melhor sem me dar conta,
dono das coisas simples, simples coisas
que a gente tem sem perceber que tem:
- era a rua tão clara ao meu bom dia,
toda a gente que adiante ia encontrando
nas calçadas, nos carros, pelas portas,
que sem saber comigo partilhava
do meu mundo - cenário e companhia.
Depois, o meu trabalho cada dia
recopiado em carbono tal e qual:
o cafezinho, o bate-papo, a roda,
os romances "vantagens", sem história,
e o retorno cansado, ao vir da tarde,
o meu banho de mar, o meu cinema.
Eu era um homem simples, verdadeiro,
igual a outro qualquer, e eu nem sabia!
- com lugar de partida e de chegada
e um vago tédio de quem vai levado
nessa felicidade imbeliscada.
........................................................................................................
A minha vida era, afinal, um disco
que ficara esquecido na vitrola.
..........................................................................................................
De repente, chegaste! Oh, nunca mais
soube de mim, nem sei de minha vida!
Agora, sou alguém que vive a espera
do momento em que deve te encontrar
sem nunca ter certeza se virás...
E enquanto espero, nada sei fazer
senão pensar em ti... sofrer em mim!
A vida é uma ansiedade, uma aventura,
o ciúme, uma malária que me arrasa,
e eu te sigo e longe, e ainda mais perto:
e me pisas sem ver, menos que sombra.
Oh, saudade do disco na vitrola,
da rotina da vida cotidiana,
- o trabalho, o café, o tédio, o lar -
do homem simples, morrido, verdadeiro,
oh, saudade da linha circular…
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Universo Trovadoresco de WALDIR NEVES
Rio de Janeiro/RJ (1924 – 2007)

Vergonha, mesmo, passou
dr. Cornélio, homem sério.
Imaginem… Processou
a mulher por adultério.
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Universo das Sextilhas de A. A. DE ASSIS
(Antonio Augusto de Assis)
Maringá/PR

A humanidade, criada
à imagem do Criador,
não dando a tal privilégio
o seu devido valor,
perdeu-se ao perder de vista
a vocação para o amor.
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O Universo Poético de LEILA MICCOLIS
Rio de Janeiro/RJ
Roteiro

— "Mas que surpresa boa eu encontrá-la.
Lembra de mim?" — "Me lembro: o escritor...
Já li seu livro" — "E então?" — "Tem muito humor
e o fim, confesso, me deixou sem fala..."
— "Bom que gostou! Eu... quero convidá-la
Para um debate". — "E qual o tema?" —"Amor...
Será de noite". — "Hoje???" — "Por favor"...
— "Irei" — "Perfeito, às oito vou pegá-la..."
— "É muito incômodo..." — "Nem diga isso!
Mas se tiver um outro compromisso..."
— "Não... está bem, anote a residência..."
— "Até mais ver..."  — "Até..." e fui embora,
tendo-a seguido antes, uma hora,
para forjar a falsa coincidência.
====================
O Universo de Versos de  ANIBAL BEÇA
(Anibal Augusto Ferro de Madureira Beça Neto)
Manaus/AM (1946 – 2009)
Joropo para timples e harpa

Em duas asas prontas para o vôo
assim se foi em par a minha vida
e com rilhar de dentes me perdôo
trilhando as horas nuas na medida
Bilros tecendo rendas amarelas
bordando em vão um tempo já remoto
no sol dos girassóis da cidadela
canto um recanto que me faz devoto
A dor que existe em mim raiz que medra
no rastro mais sombrio as minhas luas
talvez não fora Sísifo ou a pedra
que encontro todo dia pelas ruas
ao revirar as heras nessa redra
trilhando na medida as horas nuas
==============================
Galáxia de Aldravias da CECY BARBOSA CAMPOS
(Juiz de Fora/MG)

sol
agonizante
atrás
do
morro
expira
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UniVersos Melodicos
Herivelto Martins e Valdemar Ressurreição
QUE REI SOU EU?

(samba/carnaval, 1945)
Que rei sou eu
Sem reinado e sem coroa
Sem castelo e sem rainha
Afinal que rei sou eu?
(bis)
O meu reinado
É pequeno e é restrito
Só mando no meu distrito
Por que o rei de lá morreu
Não tenho criado de libré
Carruagem sem mordomo
E ninguém beija meus pés!
Meu sangue azul
Nada tem de realeza
O samba é minha nobreza
Afinal que rei sou eu?
Que rei sou eu
Um falso rei?
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Constelação Haicaista de MÁRIO ZAMATARO
(Mário Augusto Jaceguay Zamataro)
Curitiba/PR

Cheiro de chuva
entre nuvens carregadas.
Essência do vento!
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O Universo das Poetisas Paranaenses
MARÍLIA KUBOTA
(Paranaguá)
Metamorfose

sob a casa descascada
a lagarta da seda
arredonda a redoma
e sonha asas.
a sombra do luto
anuncia:
breve, aqui, mais um fruto
da metamorfose
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O Universo Poético de PEDRO DU BOIS
Itapema/SC (1947)
Trazer

Da trama a luz volatizada
entregue ao peregrino na passagem
do estado de tristeza na realidade
que queima odores não uniformes
de ondas mornas o canto
da luz da espera no pensamento
inútil do querer: feito leão
solto na paragem da solidão
no espaço o tempo tarda
na simples luz de estrelas
e firmamentos onde o caminhante
no contorno das feições esconde
a notícia não trazida em intraduzível
gesto contido na flor de outras épocas
(é seca a hora).
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O Universo de Versos de RAIMUNDO CORREIA
(Raimundo da Mota Azevedo Correia)
Baía de Mogúncia/MA , 1859-1911
Eviterno amor

Essa história do amor, que a uma só vida
Bilhões extrai, prolífico e fogoso,
Essa — ó gênero humano desditoso! —
Enche o tempo, enche o espaço, indefinida...
Adão, o arrependido, e a arrependida
Eva, ei-los avexados, ante o iroso,
Bíblico Deus, severo e rigoroso,
De quem toda essa história é já sabida.
E ele, que em beijos e ais no Éden surpreende
O ágil mancebo e a adolescente linda,
Sobre ambos vingadora a dextra estende.
Arrependem-se? Embora! O amor não finda,
Pois o par amoroso se arrepende
De ter amado, mas... amando ainda!
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O Universo Poético de RAQUEL ORDONES
Uberlândia/MG
Lendo em azul

Linhas e entrelinhas azuis; leio no céu
E o mar se faz poesia no mesmo tom
Minha alma uma inquietude em véu
E um arco-íris sorri com o seu batom.
E o azul é de imensidão inenarrável
O silêncio borbulha no ruído da onda
Há nas gotas um barulho incalculável
Há um equilíbrio na chuva que ronda.
E o meu olhar não é azul, mas reflete
Um manto que o céu cobre toda terra
No dia de hoje e no amanhã se repete.
Nuvem aqui, nuvem acolá, se mistura
O azul prova e em azulado se encerra
É verso em mar e lá adiante na altura.
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Universo Poético de MACHADO DE ASSIS
(Joaquim Maria Machado de Assis)
Rio de Janeiro (1839 – 1908)
“Entra cantando, entra cantando, Apolo!”

Entra cantando, entra cantando, Apolo!
Entra sem cerimônia, a casa é tua;
Solta versos ao sol, solta-os à lua,
Toca a lira divina, alteia o colo.
Não te embarace esta cabeça nua;
Se não possui as primitivas heras,
Vibra-lhe ainda a intensa vida sua,
E há outonos que valem primaveras.
Aqui verás alegre a casa e a gente,
Os adorados filhos, - terno e brando
Consolo ao coração que os ama e sente.
E ouvirás inda o eco reboando
Do canto dele, que terás presente.
Entra cantando, Apolo, entra cantando.
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Galáxia Poética de AMAURY NICOLINI
Rio de Janeiro/RJ (1941)
A Árvore da Vida

Vida! Milagre que renasce a cada hora,
a cada anoitecer, a cada aurora,
e se prolonga pelo tempo certo
para que cada um encontre a si mesmo,
siga o seu caminho, sem andar a esmo,
e a cada dia do fim chegue mais perto.
Vida! Tanta experiência acumulada
pensar-se-á, enfim desperdiçada
quando essa caminhada chega ao fim?
Não, porque cada história é registrada
e fica. E também se multiplica
em torno de quem partilhou esses momentos
e os incorpora aos próprios sentimentos
como se fossem lembranças. Ou lições.
Vida ! Medida entregue a nós, quantificada,
para ser gasta aos poucos nessa estrada
guiados pelos nossos corações.
O bem supremo, a jóia preciosa
que fazemos medíocre, ou gloriosa
porque o que somos, cremos e sonhamos
é que dará a ela as nossas dimensões.
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Galáxia Poética de AVANIEL MARINHO
Recife/PE
Escrita fina

Nenhuma tocha ardente e fumegante
queimará meus punhos, a ponto
de parar minha pena de escrita!
Hei de escrever enquanto viver!
É-me prazeroso e reconfortante;
dá-me fleumático levitar de conto;
leva-me à água doce prescrita;
incendeia-me o bem e o bem-querer!
Podem me negar os microfones;
acautelem-se contra meus vernáculos;
tapem os ouvidos ensurdecidos!
Mas verão a olho nu ou de óculos,
meus versos de amor ou aguerridos.
Ter-me-ão escrevendo tempos e ícones!
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Universo Poético de LUIS VAZ DE CAMÕES
Portugal (1524 – 1580)
XVII

Quando da bela vista e doce riso
Tomando estão meus olhos mantimento,
Tão elevado sinto o pensamento,
Que me faz ver na terra o Paraíso.
Tanto do bem humano estou diviso,
Que qualquer outro bem julgo por vento:
Assim que em termo tal, segundo sento,
Pouco vem a fazer quem perde o siso.
Em louvar-vos, Senhora, não me fundo;
Porque quem vossas graças claro sente,
Sentirá que não pode conhecê-las.
Pois de tanta estranheza sois ao mundo,
Que não é de estranhar, dama excelente,
Que quem vos fez, fizesse céu e estrelas.
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Galáxia Poética de MANUEL BANDEIRA
(Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho)
Recife/PE (1886 – 1968) Rio de Janeiro/RJ
Um sorriso

Vinha caindo a tarde. Era um poente de agosto.
A sombra já enoitava as moutas. A umidade
Aveludava o musgo. E tanta suavidade
Havia, de fazer chorar nesse sol-posto.
A viração do oceano acariciava o rosto
Como incorpóreas mãos. Fosse mágoa ou saudade,
Tu olhavas, sem ver, os vales e a cidade.
— Foi então que senti sorrir o meu desgosto...
Ao fundo o mar batia a crista dos escolhos...
Depois o céu... e mar e céus azuis: dir-se-ia
Prolongarem a cor ingênua de teus olhos...
A paisagem ficou espiritualizada.
Tinha adquirido uma alma. E uma nova poesia
Desceu do céu, subiu do mar, cantou na estrada...
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Universo Poético de WILLIAM SHAKESPEARE
Stratford-upon-Avon, Reino Unido (1564 – 1616)
Soneto 18

Como hei de comparar-te a um dia de verão?
És muito mais amável e mais amena:
Os ventos sopram os doces botões de maio,
E o verão finda antes que possamos começá-lo:
Por vezes, o sol lança seus cálidos raios,
Ou esconde o rosto dourado sob a névoa;
E tudo que é belo um dia acaba,
Seja pelo acaso ou por sua natureza;
Mas teu eterno verão jamais se extingue,
Nem perde o frescor que só tu possuis;
Nem a Morte virá arrastar-te sob a sombra,
Quando os versos te elevarem à eternidade:
Enquanto a humanidade puder respirar e ver,
Viverá meu canto, e ele te fará viver.
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O Universo Poético de PAULO VINHEIRO
(Paulo Vieira Pinheiro)
Monteiro Lobato/SP
Quisera

Quimera, alguma esperança mantenho
Cantilena, monotônica toada trovoa
Do boi o carro carroçando vai cantando
À vera trocam letras tropeçando pedras
Escrevo sem sentidos, abstraio teus olhos
Perdoe o perverso que rabisco à toa
Enxugo lágrimas que não nasceram
Em vão de página... Quem sabe em vão
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Galáxia Poética de JOSÉ A. JACOB
(José Antonio de Souza Jacob)
Juiz de Fora/MG
Noite no bar

Daqui do bar a noite é uma criança
Que, lá de fora, espia da vidraça
A espuma doce que desliza mansa
E que escorrega no cristal da taça.
E dos meus olhos feitos de fumaça,
De indiferença ao lustre que balança,
Envio acenos de desesperança
Detrás do copo onde a bebida passa.
E quando não me basta mais um trago
Remexo no meu bolso, dou um afago,
E uma pequena foto se revela.
Bem desgastada dos carinhos meus
E amarelada do sorriso dela
Onde no verso está escrito: Adeus!...
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A Constelação Poética de LILIAN MAIAL
Rio de Janeiro/RJ
Soneto a Gregório de Mattos e Guerra

Que se expurgue o clamor de quem pragueja,
dia a dia por permitir-se otário,
doa a alma, deixa as calças na igreja
para desfrute do gentil vigário.
Fala-se de trabalho, o Zé boceja:
"Num cunsigo vivê como um canário..."
prefere a débil fé que o eleja:
cordeiro de batina de um falsário.
"Jamais roube, ou mate, ou seja obsceno"
convenceu-se ao ouvir tal homilia,
comprou um lote do eterno terreno;
enfim irá sorrir de alegria,
escapou do inferno o bom sarraceno?
morreu de fome por vil simonia.
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Constelação Poética de CAROLINA RAMOS
Santos/SP
Retornando… De uma festa poética

Obrigada, Senhor, eu Te agradeço
os dias de emoção que me ofertaste;
este sol, esta luz, que não tem preço
e faz do céu azul o seu engaste;
estes campos viçosos que se estendem
numa carícia aos olhos que, cansados,
buscam repouso e o brilho reacendem
na veludosa ondulação dos prados.
Obrigada, Senhor, pela ternura
colhida em cada gesto, em cada olhar…
ficou mais bela a minha noite escura
depois do beijo suave do luar.
Obrigada, Senhor, muito obrigada,
pela doce esperança que acarinho
de que a Poesia, que me abriu a estrada,
me ajude a reencontrar este caminho!
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O Universo Poético do Príncipe dos Poetas de Piracicaba
LINO VITTI
Piracicaba/SP (1920)
Ao passar do vento

Quando tremula a fronte ao passar de uma brisa
é um sorriso floral dos galhos verdejantes;
quando às águas do lago um leve sopro alisa,
como a sorrir também, felizes e arquejantes;
quando às flores, sem nome, uma aura que desliza
beija e afaga a sonhar doces sonhos distantes;
quando às nuves no céu azul canta e suaviza
numa glória de sol e brilhos coruscantes;
eu cismo e vejo bem que os harpejos que passam
unidos pelo amor, pelo amor se entrelaçam,
e, alegres, todos vão com modos galhofeiros,
mostrando a nosso olhar, talvez muito cansado,
toda a beleza que há no vento tresloucado,
no sublime correr dos ventos passageiros.
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Poesia Além Fronteiras
WILLIAM BLAKE
Londres/ Inglaterra (1757 – 1827)
O pastor

Que doce a doce lida do Pastor,
Da madrugada à noite ele vagueia:
Seus carneiros no campo pastoreia,
E a sua voz é cheia de louvor.
Porque ele ouve o balido do cordeiro
E o replicar da ovelha, e atentamente
Vigia enquanto pastam calmamente,
Pois sabem que está perto o Pegureiro.
(Tradução: Renato Suttana)

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